DOÍDO PENSAR
Doído pensar que estive muitas vezes neste
local. Claramente, lembro-me de esperar as tardinhas, depois das aulas.
Vínhamos uma turma para apanhar
cajazinho. Era tão longe, quase uma
maratona. Voltávamos com as sacolas cheias. Ácida fruta. Cítrica. Mas a festa era
garantida. Tínhamos que voltar logo ,
antes de escurecer, matos e contos à respeito dos cajazeiros e mil contos de
assombrações por lá.
Hoje, de
volta ao mesmo lugar, apenas uma solidão nostálgica. Os frutos e as árvores continuam aqui. Os
frutos azedam meu paladar... mas não tanto quanto a saudade que tenho de outrora.Quando
o sabor era ácido, porém tão doce companheiro. Inocentes. Com único intuito de
brincar e celebrar a vida.
"Vamos ao morro do João Gino!" E corríamos à solta sem
compromissos com a vida ...Agora, degustando alguns frutos, a memória parece-me
pregar peças. Onde está o morro? Talvez nunca tenha existido, o que realmente
existiu foi minha infantilidade, que também passou... Olhando de longe tudo parece igual. Na verdade nada mais é igual. Até eu mesma não sou mais
"eu". As pessoas que passam
por mim são estranhas, pareço ter perdido um espaço de tempo que não vivi.
Sabe quando você chupa o cajá? A boca fica sensível, acidez gostosa de
sentir. Um doce azedo e amargo. Bem assim que estou sentindo. Uma doce lembrança que amarga por
dentro. Quis asas. Voei, fugi, voltei. Mas não poderei ficar. Não saberia sobreviver mais da forma de
antes.
Depois das asas, caminhar a
passos lentos se torna cansativo. Mas
vou lembrar-me sempre meus cajazeiros,
onde fui feliz de verdade. A
terna infância perdida no tempo. Vou sempre falar de mim aqui na Jampruca. Afinal na minha autobio você não pode
faltar. Como contar de mim e não falar
de quantas vezes estive nesta sombra; seria impossível. E no mais, foram 30 anos de ausência. Se este cheiro adocicado um dia fugir da
minha mente, não serei mais "eu".
Deixo esta estrada com
lágrimas...saudades sempre Jampruca!
Ângela Matos ( MG)
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